João Pedro Lamana Paiva
Registrador de Imóveis da 1ª Zona de Porto Alegre
Presidente da ANOREG/RS
Conforme notícia divulgada pela Agência Senado, no dia 22 de dezembro do corrente ano o Congresso Nacional derrubou quatro vetos da Medida Provisória nº 1.085, transformada na Lei nº 14.382/2022, sendo que no Senado foram 64 votos pela derrubada dos vetos e dois contrários, ao passo que na Câmara o placar foi de 391 a 25.
Os quatro dispositivos cujos vetos foram derrubados são os seguintes:
- Um item do artigo 10 que determina que ocorra no momento do registro da compra e venda a extinção do “patrimônio de afetação”, uma espécie de segregação do bem para que sirva como garantia da conclusão do imóvel (§ 1º do art. 31-E da Lei nº 4.591/64).
- Outro item do artigo 10, inserido a partir de emenda, mantém regime de tributação diferenciado para os imóveis objetos da extinção do patrimônio de afetação (§ 3º do art. 31-E da Lei nº 4.591/64).
- No artigo 11 volta a vigorar a exigência de ata notarial lavrada por Tabelião de Notas nos pedidos de adjudicação compulsória extrajudicial do imóvel (inciso III do §1º do artigo 216-B da Lei 6.015/73).
- No mesmo artigo 11 mantido o dispositivo que dispensa regularidade fiscal do vendedor para a adjudicação compulsória extrajudicial (§2º do artigo 216-B da Lei 6.015/73).
Os vetos derrubados do artigo 10 relativos à Lei 4.591/64, ao retirar a obrigatoriedade de averbação específica do patrimônio de afetação quando implementadas certas condições, considerando desse implemento decorrer a extinção automática, não impedem que esta seja procedida, desde que assim requerido expressamente pelo incorporador e/ou pelo adquirente, uma vez que o legislador utilizou a expressão “sem necessidade de averbação” e, portanto, não vedou essa possibilidade. Tema a ser estudado e refletido pelos operadores do Direito e empresários da construção civil em busca do melhor e mais seguro caminho.
Quanto aos vetos derrubados do artigo 11, pode-se afirmar que modificam positivamente a adjudicação compulsória extrajudicial, pois trazem de volta para o procedimento a necessária figura do Tabelião de Notas, o qual exerce a atividade mais afeita à verificação das questões envolvendo o negócio jurídico de promessa de compra e venda que o requerente pretende efetivar ou, em não sendo possível, adjudicar compulsoriamente seu objeto. A participação do Tabelião não será mera formalidade, mas, muito pelo contrário, servirá para gerar mais segurança e regularidade ao procedimento, agregando a ele o olhar cauteloso acerca da possibilidade ou não de aplicação do instituto, visando a conformação do caso concreto ao título que servirá para integrar o pedido de regularização, de modo similar ao que hoje já ocorre com a usucapião extrajudicial (art. 216-A, I da Lei nº 6.015/73).
Em uma análise preliminar pode-se dizer que a disciplina do inciso III do §1º do artigo 216-B da Lei 6.015/73, quando conjugada ao inciso II do mesmo dispositivo legal, fará com que o procedimento de adjudicação compulsória extrajudicial inicie no Registro de Imóveis com o respectivo requerimento (petição inicial) contendo o pedido de notificação extrajudicial dirigida a quem deve outorgar a escritura pública para que assim o faça. Passados os 15 dias (úteis) sem manifestação do notificado, tal ocorrência será certificada pelo Registrador a fim de que o requerente possa adotar a providência prevista no inciso III do §1º do artigo 216-A, ou seja, para que se dirija a um Tabelionato de Notas a fim de lavrar a ata notarial.
Muitas são as questões que deverão ser analisadas sob a nova ótica do procedimento que a derrubada dos vetos proporcionou, estudo este já em andamento no Registro de Imóveis da 1ª Zona de POA para auxiliar os usuários que têm interesse em utilizar tal procedimento. Em breve novas orientações estarão disponíveis no site.
Finalmente, no mesmo artigo 11 foi mantido o dispositivo que dispensa o prévio registro da promessa de compra e venda ou de cessão e da comprovação da regularidade fiscal do vendedor para a adjudicação compulsória extrajudicial (§2º do artigo 216-B da Lei 6.015/73).
Os trechos vetados e apreciados em sessão semipresencial do plenário do Congresso Nacional em 22/12/2022, aguardam a remessa e devida comunicação ao Presidente da República que deverá proceder a promulgação conforme dispõe o art. 66, § 5º da Constituição Federal.
A seguir os dispositivos legais com as alterações promovidas pelas derrubadas de veto, ainda não promulgadas.
Porto Alegre-RS/Janeiro/2023.
LEI 14.382/2022 – VETOS DERRUBADOS QUE ALTERAM A LEI 4.591/64
§ 1º e 3º do art. 31-E da Lei nº 4.591/64 – vetos derrubados, passando o dispositivo legal a ter a seguinte redação:
Art. 31-E. O patrimônio de afetação extinguir-se-á pela:
I – averbação da construção, registro dos títulos de domínio ou de direito de aquisição em nome dos respectivos adquirentes e, quando for o caso, extinção das obrigações do incorporador perante a instituição financiadora do empreendimento;
II – revogação em razão de denúncia da incorporação, depois de restituídas aos adquirentes as quantias por eles pagas (art. 36), ou de outras hipóteses previstas em lei; e
III – liquidação deliberada pela assembléia geral nos termos do art. 31-F, § 1o.
§ 1º Na hipótese prevista no inciso I do “caput” deste artigo, uma vez averbada a construção, o registro de cada contrato de compra e venda ou de promessa de venda, acompanhado do respectivo termo de quitação da instituição financiadora da construção, importará a extinção automática do patrimônio de afetação em relação à respectiva unidade, sem necessidade de averbação específica.
§ 2º Por ocasião da extinção integral das obrigações do incorporador perante a instituição financiadora do empreendimento e após a averbação da construção, a afetação das unidades não negociadas será cancelada mediante averbação, sem conteúdo financeiro, do respectivo termo de quitação na matrícula matriz do empreendimento ou nas respectivas matrículas das unidades imobiliárias eventualmente abertas.
§ 3º A extinção no patrimônio de afetação nas hipóteses do inciso I do “caput” e do § 1º deste artigo não implica a extinção do regime de tributação instituído pelo art. 1º da Lei nº 10.931, de 2 de agosto de 2004.
LEI 14.382/2022 – VETOS DERRUBADOS QUE ALTERAM A LEI 6015/73
Inciso III do § 1º e § 2º do art. 216-B da Lei nº 6.015/73 vetos derrubados, passando o dispositivo legal a ter a seguinte redação:
Art. 216-B. Sem prejuízo da via jurisdicional, a adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão poderá ser efetivada extrajudicialmente no serviço de registro de imóveis da situação do imóvel, nos termos deste artigo.
§ 1º São legitimados a requerer a adjudicação o promitente comprador ou qualquer dos seus cessionários ou promitentes cessionários, ou seus sucessores, bem como o promitente vendedor, representados por advogado, e o pedido deverá ser instruído com os seguintes documentos:
I – instrumento de promessa de compra e venda ou de cessão ou de sucessão, quando for o caso;
II – prova do inadimplemento, caracterizado pela não celebração do título de transmissão da propriedade plena no prazo de 15 (quinze) dias, contado da entrega de notificação extrajudicial pelo oficial do registro de imóveis da situação do imóvel, que poderá delegar a diligência ao oficial do registro de títulos e documentos;
III – ata notarial lavrada por tabelião de notas da qual constem a identificação do imóvel, o nome e a qualificação do promitente comprador ou de seus sucessores constantes do contrato de promessa, a prova do pagamento do respectivo preço e da caracterização do inadimplemento da obrigação de outorgar ou receber o título de propriedade;
IV – certidões dos distribuidores forenses da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente que demonstrem a inexistência de litígio envolvendo o contrato de promessa de compra e venda do imóvel objeto da adjudicação;
V – comprovante de pagamento do respectivo Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI);
VI – procuração com poderes específicos.
§ 2º O deferimento da adjudicação independe de prévio registro dos instrumentos de promessa de compra e venda ou de cessão e da comprovação da regularidade fiscal do promitente vendedor.