Se está na internet é verdade? Para a Justiça brasileira, nem sempre. Pelo menos, quando se trata de prints de redes sociais oferecidas como evidência em processos judiciais. Mesmo que a captura de tela registre a prática de algum delito, ainda não há um consenso sobre sua validade nos tribunais.
Apesar do impasse, os printscreens ainda são considerados provas importantes quando certos procedimentos reforçam sua legitimidade, segundo especialistas ouvidos por Tilt. Ou seja: é preciso demonstrar que foram insuscetíveis a eventuais adulterações.
Por que Justiça desconfia dos prints
“Fica muito difícil você tornar essa prova idônea, pois essa mensagem pode ter sido alterada antes. A legitimidade fica bastante comprometida. Agora, se o print vier composto de elementos que deem credibilidade, a situação muda”, avalia o advogado Leonardo Pantaleão, mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP e sócio-fundador da Pantaleão Advogados.
O advogado Matheus Falivene comenta que a Justiça brasileira analisa prints sem autenticação com desconfiança porque hoje em dia há diversas maneiras de adulterá-los. É o caso de aplicativos que fazem montagens de conversas no WhatsApp que se assemelham bastante às reais.
Os especialistas alertam que, no caso de processos penais, a Justiça ainda é mais rígida. É que existe, desde 2019, a chamada “cadeia de custódia da prova”, instituída pelo Pacote Anticrime. Ela estabelece um rito no tratamento de evidências que podem embasar a acusação, definindo regras de como elas devem ser coletadas, processadas e até descartadas.
“É extremamente importante que a defesa fique atenta para que a cadeia de custódia tenha sido respeitada [com os prints]. Se isso não aconteceu, pode ocorrer a nulidade da prova, uma vez que não foram respeitadas as etapas legais”, acrescenta Pantaleão.
Como tornar um print legítimo para a Justiça
O primeiro ato que se deve fazer, claro, é tirar o print. Tilt já mostrou as melhores maneiras de fazer isso tanto com computador em sistemas operacionais Windows, Mac e Linux; quanto em celulares e tablets.
Após isso, segundo especialistas ouvidos, existem maneiras na própria internet de provar a autenticidade das imagens, que já foram aceitas em tribunais.
- PAC Web: É uma extensão no seu navegador. Ela gera automaticamente um relatório com código único comprovando que o conteúdo foi publicado na internet, postado em redes sociais ou enviado em chats privados. O serviço é pago, mas mulheres que sofreram violência virtual podem usar a ferramenta gratuitamente através do projeto “Posso Provar”.
- Startups: Se você quiser deixar esse serviço com alguém que tenha mais habilidade com tecnologia, existem startups especializadas nisso. É o caso da Verifact, que emite um relatório técnico certificado com as telas registradas, dados e metadados técnicos auditáveis.
A boa e velha ata notarial
Agora, se quiser seguir a maneira mais tradicional, existe a ata notarial, documento emitido em cartório com o que se entende como “fé pública” – ato verdadeiro e impessoal.
No Brasil, este procedimento é muito usado. Um levantamento do CNB (Colégio Notarial Brasileiro), a pedido de Tilt, mostra que a emissão de 439.485 atas notariais entre 2017 e 2021. O número inclui autenticações de prints e demais documentos.
Chamam atenção os meses outubro em 2018 e 2020, quando aconteceram eleições. Em seus respectivos anos, foram os meses com mais emissões de atas, possivelmente motivadas pela intensa circulação de fakes news ligadas aos candidatos.
Ao levar o print ao cartório, o tabelião dá a “fé pública” na captura de tela ao detalhar o procedimento usado para acessar as mensagens e informar, além do conteúdo da conversa, quem são os envolvidos. O profissional também irá incluir outros detalhes técnicos que o declarante possa fornecer naquele momento.
Casos divergentes
Em julho de 2021, o TRT (Tribunal Regional do Trabalho) da 4ª Região manteve a demissão por justa causa de uma servidora pública de Sapucaia do Sul (RS) que esteve em festas durante um período de dispensa por atestado médico. A decisão se deu após os desembargadores analisaram prints da rede social com fotos que a mostravam nos eventos.
Porém, quatro meses antes, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) anulou um inquérito policial que gerou uma acusação por corrupção contra um réu ao incluir, no processo, prints de WhatsApp enviados por um denunciante anônimo.
Ambos os casos analisaram prints como prova. Qual a diferença entre eles? O STJ desconsiderou as capturas de tela por um detalhe: a acusação não conseguiu comprovar que elas eram autênticas, sem alterações ou manipulações.
“A tendência é de que o mero print passe a não ser admitido em todos os ramos do direito, seja ele penal, civil ou trabalhista, por exemplo”, confirma Falivene, também doutor em Direito Penal pela USP (Universidade de São Paulo) e professor na pós-graduação da PUC-Campinas.
Fonte: Portal UOL